sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Encontro com a solidão

Durante estes anos de trabalho, fazendo inquéritos, sou eu a ir ao encontro das pessoas, muitas vezes tirando-as do seu sofá ou distraindo-as dos seus afazeres. Muitas histórias teria eu para contar, todas de índole humana. Pessoas que passam ao lado de muita gente sem ninguém dar por elas, mas cheias de histórias ricas, algumas tristes, outras com capacidades e habilidades de artista e que quase ninguém conhece.
Mas a história de ontem é diferente. Não fui eu a ir ter com ninguém, foi alguém a vir ter comigo. Estava eu a fazer um intervalo num dos cafés do costume e comia qualquer coisa enquanto adiantava a parte escrita do meu trabalho. Entrou um senhor no café. Um ar normal. Um pouco escuro o que ele transmitia, mas ainda assim normal. Passeou pelo café, olhou para mim, pediu licença para falar comigo, e eu fiquei sem saber o que dizer. Se era para os peditórios do costume, eu estava ali a trabalhar e não queria ser interrompida.
Mas não. O senhor só queria mesmo era falar. Ele foi falando, chorando de vez em quando, falando e falando. Não era louco. Sabia muito bem o que sentia e em que situação estava. "Sinto-me sozinho, sinto-me triste, às vezes sinto-me esquizofrénico." No entanto, na aparência, e a acreditar em tudo o que possuía, era uma pessoa abastada. Mas sozinho.
Senti-me tão impotente. Mas ele só queria falar. E olhava para mim, fundo nos olhos. Falei-lhe umas palavras de encorajamento, ainda lhe falei de Deus, mas senti-me impotente na mesma. De que vale falar de Deus a um esfomeado se não lhe der um pedaço de pão? Só depois da barriguinha cheia é que ele poderá ter ouvidos para ouvir sobre tão grande amor. Este senhor precisava de muito mais do que eu lhe consegui dar, é a verdade.
Foi mais uma situação que me marcou. Vim para casa pensativa. O que pensei ainda está em processo. É cedo para pôr em palavras. O que escrevi foi meramente factual. Para que conste. Para que não se esqueça que somos muito pouco neste mundo e que, sozinhos, somos menos ainda. Para que olhemos para os outros com todo o respeito, porque cada um encerra dentro de si um mundo infinito. E que, se o descobrirmos, muitas acções que às vezes até são condenáveis, acabam por ter uma explicação. E aprendemos a entender, a respeitar, a aceitar, a amar e quem sabe, com esse amor, ajudar a mudar para melhor.

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