sábado, 30 de julho de 2016

De dentro de mim


Hoje acordei para um amanhecer fresco. O céu estava cinzento e o ar carregado da humidade que caía sobre os vidros dos carros. Uma delícia apetecida, não fosse o contraste escaldante dos últimos dias, que não deixam o corpo adaptar-se convenientemente à mudança. Mas é o que temos e é isso que usufruímos. Era cedo, tinha de ir trabalhar às 8 horas. Tomei o pequeno-almoço na varanda, como é meu hábito, sem pressa e em silêncio, enquanto a casa dormia e lá fora os sons ainda eram os da natureza. A fresquidão fez-me sentir viva e agradecida. Porque as minhas maiores aflições neste momento são ter a preocupação de um filho a chegar a passos largos à pré-adolescência, com todos os sintomas que lhe são característicos, e o facto de ter fechado uma das minhas lojas de lãs preferida aqui na cidade.
Aflições a sério vivem-se na clínica onde trabalho, sem eu nem bem saber como gerir dentro de mim o bem que me aconteceu em detrimento do mal de outros. Como é que, num espaço tão curto de tempo, tal como este tempo que não nos dá margem para adaptações, passo de 2 horas de trabalho, em que mal entrei com um pé e já estou a sair com o outro, a tempo inteiro e até a 12 horas seguidas nalguns dias, quando a urgência assim o dita? Num espaço tão curto de tempo vi, não só o meu horário de trabalho alargar, como o ritmo de aprendizagem de todo o complexo funcionamento de uma clínica passar de suave e calmo para a pressão alucinante de aprender tudo rapidamente por não haver mais ninguém a não ser eu e outra colega, que me foi tentando explicar o melhor possível tudo o que sabia e a quem ainda tenho de recorrer vezes sem conta. Com uma gestora no IPO a acompanhar a filha de 3 anos com leucemia numa notícia de choque também sem margem para adaptação e uma colega grávida de baixa médica em risco de perder o bebé às 26 semanas vimo-nos, eu e a colega que sobrou, sozinhas, com uma clínica em cima dos ombros.
Não foi fácil, nada fácil. A insegurança que me é característica tentou levar a melhor sobre mim por diversas vezes. Mas enfim, lá continuei a trilhar o meu caminho com passos lentos mas firmes. As férias que tínhamos marcadas desde o início do ano, foram-se. O pouco tempo que poderíamos ter livre, foi-se também. Mas penso que talvez o choque inicial já se esteja a desvanecer e estejamos a entrar na rotina. Com uma gestora recrutada para gerir os nossos destinos em part-time, é bom saber que não estamos esquecidas e que o nosso trabalho está a ser reconhecido.
Vivemos tempos de crise. No mundo, no país, na clínica e, muitas vezes, nas nossas próprias casas. Mas é muito importante acordarmos todos os dias, ou pelo menos a maior parte deles, com o bichinho da vida a mexer dentro de nós e a lembrar-nos que há sempre esperança e que há sempre um caminho a percorrer, independentemente das dificuldades. Para mim, agora, basta-me saber que estou a fazer um bom trabalho dentro do que sei, basta-me um raio de sol e uma ponta de ar fresco para encher os pulmões, basta-me um bordado e um crochet para terminar, bastam-me os beijos do meu filho para me mostrar que afinal ele não é assim tão mau menino ;) e basta-me ter a consciência do amor de Deus na minha vida para apreciar tudo isto.
Agora, com licença, vou ali continuar mais um bocadinho do meu bordado.


*esta semana o Domingo de gratidão será novamente à segunda


quarta-feira, 27 de julho de 2016

Seja onde for, o abraço é a casa do amor











Que o dia seja repleto de flores, abraços e amores para que nos sintamos em casa, onde quer que estejamos!


segunda-feira, 25 de julho de 2016

Domingo de gratidão à Segunda :)


Domingo. Dia de abrandar. Dia de contar as bênçãos da semana que passou. Dia de agradecer. Independentemente das circunstâncias da vida, há sempre algo pelo que ser grato. Esta semana fui grata por:


  • Celebrar um aniversário ao ar livre, como convém num dia de Verão.




  • Experimentar o doce de ameixa com chocolate, receita do chef da casa em experiências de aproveitamentos.


  • Aproveitar os legumes da horta e fazer esta receita de acelgas com pinhões e outra de courgetes com molho de tomate, num acto de gratidão pelos produtos da terra e de amor pelos da casa.


  • Continuar a pintar a casa e desta vez, mais uma corzinha no quarto do piqueno: verde em duas paredes, para alegrar as hostes :) Nada como mudar de vez em quando.


  • Continuar a observar as lagartas, que continuam em transformação dentro do casulo. Já se vêem os olhinhos e a formação das asas. Mas a mim parece-me que está a demorar muito tempo...


  • Saborear o prazer e a possibilidade de comprar livros! Estes dois, para dar de comer ao meu povo e aproveitar de maneira mais variada e criativa os legumes que trazemos da horta. Delícia!
  • Aproveitar os noites frescas para passear a pé pelo quarteirão, sem pressas e com muita conversa.
  • Aproveitar o ar fresco da noite para estar na varanda a conversar calmamente.
  • Regozijar diante da nova possibilidade de mudança. Quando desejada, a mudança é sempre boa.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

O nosso Verão tem sido assim








Falo da parte boa deste tempo quente, claro, que nos permite juntar alguns membros da família ao ar livre, à sombra dos sobreiros e à volta de uma mesa e bancos improvisados. Falo da parte do pouco tempo que me permito desfrutar e relaxar. Falo da parte em que, por tudo isto, permito que o calor não me sufoque assim tanto. Falo da parte em que faço nascer possibilidades do tempo que usufruo junto de outros. É quase como se estivesse de férias. Numa fase em que trabalho mais horas do que alguma vez trabalhei... Quase que consigo dizer: "E viva o Verão!"

terça-feira, 19 de julho de 2016

Boa tarde!








«sê fiel a ti mesmo, com todos os teus defeitos, com todas as tuas neuras, com os teus pesadelos. aprende a equilibrar a felicidade, a trabalhar mais nos teus sonhos e a trazê-los para a vida real.
pratica a arte de te ligares às pessoas que te acolhem, às que estão ao teu lado apesar do teu mau-humor repentino, apesar das tuas incertezas, dos teus percalços, das tuas falhas. 
caminha ao lado daqueles que te olham por dentro sem se importarem com o que tu carregas no bolso, no banco, no cofre ou na mão.»  
lya luft 


domingo, 17 de julho de 2016

 Domingo. Dia de abrandar. Dia de contar as bênçãos da semana que passou. Dia de agradecer. Independentemente das circunstâncias da vida, há sempre algo pelo que ser grato. Esta semana fui grata por:


  • Ver que as nossas lagartinhas comeram e engordaram a semana inteira para depois se cansarem e enroscarem no seu ninho sedoso, onde estão a transformar-se. Tem sido uma experiência bem interessante, esta de observar a ciclo de vida de umas lagartas verdes que estavam a comer a minha hortelã.

  • Celebrar a vitória de Portugal neste campeonato europeu. Sim, não ligo nadinha a futebol mas vibro quando é a selecção a jogar e muito mais a ganhar!
  • Levar uma pessoa de mobilidade reduzida a passear e a ver os cantos do seu próprio quintal, que não visita com a regularidade desejada por não ter quem a leve e sentir na pele o seu reconhecimento.
  • Limpar o curral das ovelhas mais uma vez, tarefa que me descomprime dos pesos do dia a dia e me devolve à força da natureza.
  • Comprar a prenda do homem da casa com a carracinha - uma aventura cheia de dedicação em coisas tão simples.
  • Oferecer essa mesma prenda, que se veio a compor de várias prendas e, mais uma vez percebi que não sei do que as pessoas gostam mais: se da prenda em si, se do embrulho :)
  • Receber o elogio de uma doutora ao dizer que gosta de trabalhar comigo porque diz que eu sou zen. Eheh, zen, eu? Só prova que ela não me conhece!
  • Quebrar a rotina desta semana agitadíssima e dar um senso de normalidade à minha vida, tendo um tempinho para tomar um cafézinho e ler a minha quase esquecida, este mês, Country Living.
  • Perceber que, mal ou bem, sou capaz de tomar conta do recado sozinha na clínica. Dada a intensidade anormal do ritmo das últimas semanas, tinha mesmo de aprender qualquer coisa com isto!
  • Receber os vossos comentários tão queridos, a alguns dos quais nem consegui responder por falta de tempo, mas que ficaram no meu coração. Obrigada.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Bom dia!






A janela é a casa a querer ser mundo.

Mia Couto


domingo, 10 de julho de 2016

Domingo de gratidão


Domingo. Dia de abrandar. Dia de contar as bênçãos da semana que passou. Dia de agradecer. Independentemente das circunstâncias da vida, há sempre algo pelo que ser grato. Esta semana fui grata por:



  • Preparar refeições com os legumes da horta, agora que a produção começa a abundar. Chegou a época da abundância, que me faz acreditar mais do que nunca que o facto de haver fome no mundo é apenas o resultado da má gestão global, em que os ricos saem sempre beneficiados em detrimento dos mais necessitados. Não é compreensível que tantos deitem fora o que outros tantos estão ansiosos de comer!




  • Voltar a ser criança outra vez e, em vez de dizimar de uma vez por todas as lagartas que estavam a devorar a hortelã da varanda, tirá-las todas para um frasquinho, enchê-lo com alface fresquinha, e ver o processo da natureza a desenvolver-se. É só limpar os cocós que 8 lagartinhas fazem, meter uma folha nova e vê-las engordarem. A esperança é vermos borboletas. Bem sabemos que irão sair daquelas sem graça, parecidas com as traças, mas o processo é divertido e isso justifica a manutenção desta experiência :)




  • Descansar à sombra dos sobreiros numa tarde quente depois do almoço e ver o azul do céu e ouvir o canto ensurdecedor das cigarras e agradecer por ter a barriga cheia e tempo para descansar.



  • Passar a tarde a arrumar folhas secas para um monte para depois fazer um bom fertilizante para a nossa terra. Adoro fazer isto! É inevitável pensar na Vovó Donalda, uma das minhas personagens preferidas dos livros do Tio Patinhas. Imagens que guardo dela: fazer montes de folhas secas que depois os netos Zézinho, Huguinho e Luisinho pulavam e ela ficava toda chateada, conduzir o tractor pela propriedade e ter uma tarte de maçã a fumegar no parapeito da janela. Delícia pura já na altura, em que a minha imaginação infantil se animava a pensar que, quando fosse velhinha, queria ser assim, activa!
  • Ter um tempo para usufruir de momentos sozinha, só para mim, para poder desfrutar a meu bel prazer e descomprimir da semana de trabalho sufocante.
  • Perceber que consigo reunir forças para gerir dias complicados no trabalho e ainda chegar a casa bem disposta e fazer as tarefas domésticas necessárias com amor e alegria.
  • Ter a refeição pronta ao chegar a casa naqueles dias em que chego mais tarde - não há palavras suficientes para agradecer o bom que isto é!
  • Celebrar a passagem de Portugal à final europeia na rotunda principal da cidade, com muita gente reunida a vibrar na mesma energia.
  • Passear à noite pela cidade e visitar a feira medieval a decorrer aqui na cidade, num ambiente festivo e descontraído, bom de apreciar a três.
  • Fazer prendas com a carracinha, que lhe está a tomar o gosto e a dedicar-se à tarefa com toda a dedicação e amor e retirar de dentro de si, desta maneira, o melhor que vai no seu coração. Que crescer seja uma tarefa compensadora!



quinta-feira, 7 de julho de 2016

"Já agora, vale a pena pensar nisto..."







Perdi-me e obriguei-me a parar. Tive medo e obriguei-me a continuar. Deixei para trás todos os mapas, aqueles que só me mostravam estradas já percorridas. Segui em frente a acreditar no tempo certo de tudo o que é importante. Levei comigo duas mãos cheias de amor e a [única] bússola que me guia pelo lado certo da vida.
Recomeçar é uma palavra de esperança. Acreditar, um verbo de força. O optimismo nasceu [sempre] do lado de dentro, e a subida que eu sabia difícil, foi, no final, muito gratificante. Depois, a vida veio e recompensou todas as quedas, todas as lágrimas, todas as feridas e cicatrizes. Não me trouxe nada de tangível [importa?], mas chegou com tudo o que é  apenas comparável à alegria de chegar a casa depois de muito, muito tempo fora. | sofia castro fernandes |

terça-feira, 5 de julho de 2016

Notícias da horta



Na semana passada, a horta recebeu-nos com as papoilas a darem-nos as boas vindas. O dia tinha começado cedo para o homem da casa, que foi de manhãzinha para a terra, tendo eu e a carracinha ido ter com ele carregados com a trouxa para o almoço.


Antes do almoço, tempo para dar uma vista de olhos pela terra e descobrir que o cacto que a carracinha roubou de um jardim há uns anos atrás num dos nossos passeios a pé, para me oferecer - e nunca se cansa de dizer: piquei-me todo! - está a ficar carregadinho de flores. Esta flor amarelinha. Não é linda?


O almoço foi fantástico. Estava calor na temperatura certa, os sobreiros davam a sombra certa, e os passarinhos ensaiavam as melodias certas para nos encantarem. Esta estação pede refeições leves e frescas e foi isso mesmo que nos encheu a barriguinha.


Na horta mesmo, os encantos eram muitos para mim e a enxada continuava encostada. Sinceramente, não lhe peguei. Foi mais produtivo ter registado toda a beleza que testemunhei no nosso pedaço de terra e ver como esta estação a está a tratar :) 


Flores. Todas selvagens e lindas. E todas úteis, tenho a certeza, só não lhes conheço as qualidades para tirar delas melhor partido, a não ser a beleza.


Mas enfim, a horta prospera. Este ano está tudo atrasado devido ao tempo esquizofrénico que temos tido, com chuvas intensas a impedirem as sementeiras e calor repentino e excessivo a trazer moléstias impeditivas do avanço da produção.


Mas o amor e a sabedoria tratam do resto e a obra lá vai progredindo, agora a olhos vistos. Os nossos coentros farfalhudos, os nossos feijões tenrinhos, as nossas batatas saborosas, os nossos alhos com um aroma intenso capaz de afastar qualquer vampiro, os morangos que sobram do festim dos passarinhos, e tantos outros produtos que a terra nos está a devolver.


Este ano o hominho teve a brilhante ideia de intercalar couves, feijões e outros, com alhos. E não é que tem estado a resultar? A bicharada fatídica tem ido pousar noutros sítios onde possa atacar sem ser incomodada. Pois é, temos o orgulho de dizer que a maior parte da nossa produção tem sido tratada com estrume das ovelhas e truques destes, como o do alho, que nos tem poupado muitos desgostos. Vitória!


Nesta altura do ano, nunca estamos sós. Nas terras à volta há quem aproveite a erva seca pelo calor para o gado e o rebuliço do trabalho é imenso. Adoro presenciar esta actividade.


Mas claro que toda esta abundância que está a começar a surgir não seria possível sem o bem precioso e essencial que é a água. Como eu gosto de a ver correr, fresca e cristalina a caminho das raízes sendentas. Graças ao nosso simpático vizinho que nos empresta a água do seu poço, temos tudo verdinho e a crescer.


Os regos que serviam de conduta para a água seguir para o seu destino certo sempre me encantou, desde criança. Bem me lembro de ficar agachada por longos momentos a ver a água a correr, as pedrinhas que se escondiam por baixo dela, algumas mais leves que rolavam ao sabor da corrente, o brilho do sol a espelhar-se na fresquidão, as minhas mãos pequenas que não resistiam a resfrescar-se naquela bênção. Há lá coisa melhor?


As cabeças dos alhos franceses, desta vez albergavam abelhões do tamanho do meu dedo mindinho, bicho que nunca vi na minha vida e que me assustou. Andavam ocupados de volta das sementes, mas quando passavam perto de nós, o barulho das asas a baterem era qualquer coisa de impôr respeito!


Mas indiferente, o nosso marmeleiro promete dar frutos este ano, o que me deixa encantada. Marmelada!


E os primeiros tomates cereja começam a aparecer, crocantes e saborosos, como só me lembro do Verão passado. Adoro esta coisa da sazonalidade, de saborear os alimentos na sua época própria, sem pressa nem atropelos.


E esta é a paisagem mais comum ali por aqueles lados. O rebuliço começa de manhã e vai até ao fim do dia, com tractores a cortar a erva seca e a empilhá-la, deixando-a pronta para consumir. É uma paisagem única, muito própria, esta. Cheia de aromas e dourados. Um trabalho cheio de passos encadeados uns nos outros para darem o resultado final como alimento aos animais. Tudo se aproveita, na natureza.


E enquanto observo a visão fantástica que os nossos alhos me oferecem, penso em como adoraria ter as minhas galinhas e, em vez de deitar todas as cascas dos legumes que preparamos para as refeições fora, seriam atirados para os animais comerem e fertilizarem a terra, num ciclo que a natureza, sábia, sabe manter intacto. A natureza. Porque quando entra a mão do Homem, já nada sai assim tão perfeito... Mas foi perfeita esta tarde, com um homem feliz por trabalhar a terra, um pequeno feliz por participar em tudo e por mim feliz, por sentir toda esta energia maravilhosa que só uma tarde no campo proporciona.